terça-feira, 1 de julho de 2008

Pelos meandros do eduquês...

Pelos meandros do eduquês, é uma rubrica que hoje inicio e que infelizmente daria crónicas suficientes para, por si só, alimentar o blogue.
O primeiro tema "fusão dos 1º e 2º ciclos" poderá vir a ser porventura um dos maiores atentados jamais infligidos à educação em Portugal. A proposta é da responsabilidade do Conselho Nacional de Educação (19.05.2008 - 17h17, Lusa). Ainda não teve total adesão por parte do Ministério da Educação que, no entanto, e de uma forma silenciosa, ordenou às Escolas Superiores de Educação que iniciassem a formação de futuros professores tendo em conta esta perspectiva.
Qual o cerne desta ideia peregrina? A fim de evitar possíveis traumas às criancinhas, quando passam de um regime de monodocência para uma situação em que têm de enfrentar N professores (leia-se feras indomáveis...), propõe-se que o 2º Ciclo passe também a um regime de monodocência coadjuvado (traduzindo para Português: terão um professor que leccionará as várias disciplinas e mais um ou dois professores que darão apoio em áreas especializadas como Ed. Física ou Ed. Musical). Isto é infantilizar o ensino em Portugal. Inevitavelmente, os futuros alunos terão uma formação académica mais frágil pois, mesmo que os professores se empenhem ao máximo nas suas aulas, não têm formação científica suficiente (nem vocação...) para preparar convenientemente os seus alunos e para estimular os seus interesses e o desejo de quererem saber mais.
Dar aulas não se pode resumir ao simples acto de despejar conteúdos listados nos programas oficiais. É fundamental proporcionar a curiosidade, satisfazer as dúvidas que normalmente surgem em catadupa nestas idades tão ávidas de saber. Para tal, os professores devem transmitir aos seus alunos o entusiasmo por aquilo que leccionam. Devem, também, agarrar as oportunidades que vão surgindo nas aulas para lhes fornecer conhecimentos e competências (passe o eduquês) que vão muito para além daquilo que está previsto nos currículos.
Ao contrário do que é proposto dever-se-ia, na minha opinião, caminhar em sentido contrário: não um, mas vários professores no 1º Ciclo.
Tudo isto causa-me uma enorme revolta. Os portugueses desconhecem completamente esta verdadeira conspiração que se vai preparando na sombra. É altura de nos insurgirmos e de comentarmos esta situação com os nossos amigos. Aproveitemos estes novos canais de comunicação para expressarmos a nossa total reprovação em relação a mais uma "reforma" nascida do eduquês!

9 comentários:

Al Prazolam disse...

Esta obcessão do CNE por mostrar trabalho é, por vezes, patética. E traduz-se na apresentação de propostas confluentes com o pen$amento dominante no Mini$tério da Educação e Finança$$$.

Há uma canção do Rui Veloso que diz: "Pactos e Alianças são um bom remédio para entreter marechais e lhes combater o tédio...". É só alterar algumas das palavras, para bom entendedor...

©arloslemos disse...

Olha Óscar, gosto imenso de comentar, mas há certas notícias que me chocam de tal forma que me deixam perplexo e sem palavras; apenas a vontade de ter nascido cão, vaca ou até leitão e não pertencer à espécie que cria tamanhas aberrações. Que fenómeno se está a passar na nossa sociedade? Hum? O que é isto? E que tal pagarmos as dívidas dos caloteiros da EDP? Hum? E a taxa audiovisual? E a diminuição do IVA que se nota tanto nas nossa compras? E... e... e...bem continuamos na 6ª feira.

Anónimo disse...

Sr. Óscar
Os editores dos blog's costumam ter um corrector ortográfico para evitar gralhas como "deconhecem" e distracções como "surjem"...

Óscar disse...

Glup!... Obrigado pela chamada de atenção. Já está corrigido.
E sobre o conteúdo do post não fazes comentários?

Tulius Detritus disse...

Parabéns Óscar pela forma e pelo conteúdo.

Ainda que não subscreva a teoria dos “iluminados”, por vezes evito pronunciar-me sobre questões em que não sou especialista (e não sei se sou especialista em coisa alguma …), De algum modo tenho aquele “complexo” de pensar que as medidas (políticas e outras) não são tomadas por um qualquer idiota, de ânimo leve, mas, antes, por gente com formação e visão e que, subjacente a cada decisão, existe um projecto que foi devidamente estudado, avaliado e discutido por quem sabe infinitamente mais do que eu da matéria em questão… mas há, de facto, situações em que custa ficar “calado”… em que gostava de, ao menos, ser esclarecido sobre a origem e a lógica de tão peregrina ideia.

Tanto quanto me lembro, a minha transição do 1.º para o 2.º ciclos não constituiu trauma algum; bem pelo contrário, foi até motivo de orgulho. Os meus filhos, que também já por lá passaram, não tiveram de consultar nenhum psicólogo nem pedo-psiquiatra por causa do alegado trauma… nem os meus amigos… nem os respectivos filhos…

Numa altura em que – indiscutivelmente – se tende para um, cada vez maior, grau de especialização, atribuir competências alargadas a um profissional de educação parece um pouco “nadar contra a corrente”. Veja-se o caso da saúde: há já muito que não existe o “clínico geral”; no limite poderá existir um generalista que além de “medicina familiar” pouco mais faz do que a triagem e encaminhamento de pacientes para a especialidade onde se enquadra a patologia do paciente. Os próprios médicos de especialidade, cada vez mais, tendem a especializar-se em sub-especialidades; já não há ortopedistas… há especialistas de coluna, ou de joelho, ou do osso xpto…
Sabe-se cada vez mais sobre cada vez menos.

Vejo com muita apreensão a formação de profissionais que, com eficácia, consigam leccionar, ao longo de 6 níveis de ensino, matérias tão diversas como as que serão contempladas nos conteúdos programáticos.

Será possível dar formação a professores e dotá-los de competências que lhes permitam de forma eficaz leccionar Inglês, Matemática, Ciências, etc?..
E qual é a lógica destes técnicos serem coadjuvados por professores de Educação Física e Música?.. E porque não também de Inglês?.. (por exemplo)
E as criancinhas quando chegarem ao 7.º ano já o trauma será mais pequeno porque elas serão maiores?..

Só lamento que a publicação não tenha sido brindada com a etiqueta “Socratinices” porque, se não é da autoria do Menino d’Ouro, deve ser de um dos seus “acólitos”…

PS: …e se eu fosse professor estava “bem lixado”… mais me valia comentar como anónimo.

©arloslemos disse...

Pronto, agora que estou mais calmo quero dizer, tranquilamente, que concordo contigo. Isto é, como dizes, deveríamos ir em sentido contrário. Estamos a "desespecializar" o ensino. Um professor já tem uma tarefa enorme na preparação da sua cadeira dedicada, quanto mais preparar outras matérias para as quais não se especializou. É evidente que, por mais que se esforce nunca poderá prestar um serviço de qualidade. No fim quem se prejudica é o aluno que em vez do dito "choque" no 1º-2º ciclo vai tê-lo quando entrar para a faculdade quando se aperceber que lhe falta preparação suficiente. Quem o diz já passou por isso noutra época, mas por outros motivos. Depois de passar a atribulada reforma educativa pós 25 de Abril com propedêuticos e passagens administrativas, chegou à faculdade e ficou de boca aberta a par com uma frustração. Que futuro para estes alunos vítimas destes energúmenos atrasados mentais? Mas o que me preocupa sobremaneira é a origem e a causa desta e de outras ideias em curso, puros atentados ao bom senso, e que não são sonoramente e veemente contestados, abrindo precedentes para outros “ crimes contra a humanidade”.

©arloslemos disse...

Tulius Detritus disse:
"De algum modo tenho aquele “complexo” de pensar que as medidas (políticas e outras) não são tomadas por um qualquer idiota, de ânimo leve, mas, antes, por gente com formação e visão e que, subjacente a cada decisão, existe um projecto que foi devidamente estudado, avaliado e discutido por quem sabe infinitamente mais do que eu da matéria em questão…"

Olha Tulius, já estou na fase de pôr em causa, sem complexos, o conteúdo deste excerto do teu comentário. Lembro-me vagamente no caso "Casa Pia" uma escuta telefónica ter captado a frase de Ferro Rodrigues "- Ó pá estou-me cagando..." num conteúdo relacionado com o processo. Imagina conversas de bastidores dos políticos perante situações supostamente complicadas. Lembra-te que qualquer político que cometa um erro, mesmo sendo grave e prejudicando milhares de pessoas, não é responsabilizado. O pior que lhe pode acontecer é demitir-se e receber outro cargo chorudo longe da ribalta. Por isso não há pudor em fazer experiências a ver o que é que dá!

©arloslemos disse...

Ò Óscar, estás orgulhoso de gerares polémica? Parece que ultrapassaste o Al Prazolam em comentários!

K disse...

Uma reforma surge da necessidade de mudar algo que está mal, ou que pelo menos não está bem.
Quem governa o país são os políticos.
No caso da educação, compreende-se que a mudança que vivemos desde os anos 60 nas vertentes social, moral e económica, impliquem mudanças progressivas e por vezes radicais (caso do 25 de Abril) no sistema educativo.
As mudanças no sistema educativo mostram os seus efeitos a médio e a longo prazo. São geracionais.
Ora, o sistema político com horizonte a 4 anos não pode esperar tanto tempo. Daí, a radicalidade de muita reforma, para causar impacto.
Qualquer mudança no contexto empresarial, necessita de constante avaliação e provavelmente correcção no sentido dos objectivos (o tal Balancedscorecard).
Nas nossas famílias passa-se o mesmo.
Será que nas medidas de política tal será possível?