terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Osvaldo: a história de um guarda-chuva


Os guarda-chuvas são como as esferográficas: passamos a vida a usá-los, a perdê-los e a trocá-los por outros. A nossa relação com estes objectos ilustra bem a época em que vivemos…

Dantes era diferente. As pessoas tinham os seus objectos como se fizessem um pouco parte delas próprias. Havia uma relação afectiva com a caneta Parker, com o automóvel que se tratava como se fosse quase um membro da família…
Tudo era mais duradouro e mais estimado pelos donos. Hoje o carro, a máquina fotográfica, o computador e a própria casa mudam-se ao cabo de algum tempo quase sem nenhum sentimento de nostalgia. Isto para não falar dos objectos mais banais! Esses, passam pelas nossas mãos e trocam-se a toda a hora.

Tudo isto vem a propósito do reencontro com a Casa Celestino, a antiga loja de guarda-chuvas e material de campismo (coisas mesmo parecidas!..) da Rua de Cedofeita no Porto. A vista daquela montra remeteu-me para o passado, para o meu guarda-chuva de estimação.

Certo dia, há vinte e tal anos atrás, entrei na loja para comprar um guarda-chuva. Fui atendido pelo velho Celestino que, com grande amabilidade e cortesia, me mostrou vários produtos explicando-me todos os detalhes de cada um como se se tratasse de material de alta tecnologia. Mas não, nenhum me satisfazia inteiramente. Eu queria um guarda-chuva que me abrigasse de verdade, que resistisse a qualquer intempérie. Cheio de paciência ante a minha insatisfação o senhor foi então buscar um enorme guarda-chuva de pastor, de doze varetas, com a vara central em madeira, do mesmo diâmetro da pega, e com tecido em algodão. Mal lhe peguei fiquei logo convencido. Aquele era o meu guarda-chuva.

“Eu vendo-lhe o guarda-chuva, mas não lhe garanto que o Presidente da Câmara o autorize a andar com ele na rua!..” Os sorrisos generalizaram-se entre todos os que ocupavam a loja! E lá saí satisfeito de Osvaldo na mão, que isto de comprar guarda-chuvas é só mesmo quando precisamos deles!

Muitas foram as peripécias (e o exercício físico, que ele era pesado!..) passadas com aquele mega guarda-chuva. A mais insólita aconteceu quando passeava em Santa Catarina. Ia eu distraído, num dia de chuva, quando duas raparigas, sem me dizerem nada, saíram de um abrigo e colocaram-se debaixo do Osvaldo, uma de cada lado. Sorriram para mim mas não me pediram boleia. De qualquer forma não valia a pena, era facto consumado! E lá fomos os três na alegre galhofeira, rua fora, até ao Majestic onde fui recompensado com um café e uma torrada, e uma tarde muito bem passada!..

Perdi-o, dois anos e picos depois, numa viagem de comboio. Saí na estação e ele seguiu o seu destino. Espero que tenha sido encontrado por alguém que o tivesse estimado como eu.

2 comentários:

K disse...

Bonita história.
Longa vida ao Osvaldo e aos seus protegidos.

Vital disse...

Bela história. Já conhecia, mas estás a narrar como um mestre.