domingo, 25 de janeiro de 2009

A insustentável leveza do ser


A imagem é minha


Há frases, ideias, imagens ou vivências que atravessam a nossa vida e que nunca mais esquecemos. Apropriamo-nos delas como se fossem parte de nós mesmos. Eu diria que passam a constituir uma parte da estrutura que sustenta o edifício que é a nossa própria individualidade.
A ideia central do livro de Kundera, que o amigo Vital evitou com uma leveza insustentável – só porque nas suas palavras foi unanimemente aplaudida - , é um desses exemplos.

Muito para lá de uma história de vida de 4 personagens, dos seus encontros e desencontros, o que fica de verdadeiramente genial da obra é a ideia da leveza (e de uma certa irracionalidade) com que tomamos decisões na nossa vida e de como elas podem determinar de uma forma definitiva o seu rumo.
Muss es sein? Es muss sein!” (Tem de ser assim? Tem de ser!). Esta frase, várias vezes repetida ao longo do livro, traduz precisamente essa ideia de ligeireza (e nunca a existência de um destino pré-determinado).

"(...)Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez, sem preparação. Como se o actor entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo "esboço" não é a palavra certa porque um esboço é sempre um projecto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é esboço de nada, é um esboço sem quadro (...)"

Fui buscar estas palavras, que ainda ressoavam vagamente na memória, ao livro.
A importância da tomada de decisão (e o que nos leva escolher um caminho em detrimento de outro) e, consequentemente a problemática do livre arbítrio, são aspectos que desde sempre me interessaram particularmente (até por motivos profissionais, já que este aspecto é central no domínio da educação, nomeadamente da educação ambiental).

Todas estas reflexões conduzem-me geralmente, e cada vez mais, para o domínio do afectivo e da sua esmagadora importância no contexto das nossas vidas. É por essas e por outras que o nosso António Damásio (O Erro de Descartes) é um autor fundamental dos nossos tempos.

2 comentários:

K disse...

Dedicamos todo o tempo do mundo com os mais ínfimos pormenores.
Tomamos as mais importantes decisões num ápice, e essas sim mudam toda a nossa vida.
Concordo, Óscar, deveríamos inverter o focus da nossa atenção.Mas raramente resistimos.Será um vício de forma, ou pequena dose de masoquismo?

Vital disse...

Boa prosa e ainda melhor fotografia. Tás a ficar um sepista de requintada craveira. Para quando ofereceres uma ao teu amigo?
(e um dia - quando só tu e meia dúzia se recordarem do livro - volto a ele).