Esta história é para o Hagarra que gosta de histórias com sabor a cacimbo.
À noite, mal deitei os miúdos, larguei o Sandokan, peguei num livro sobre memórias coloniais. O autor escreve muito bem, sem pretensões ou artifícios, desfiando memórias dolorosas sem tornar a dor banal. Mas, lido o livro, percebi uma coisa. Cada um tem a sua África. A minha África é diferente da África dele e da dos outros. Não encontro nas memórias da minha família desprezo ou ódio. Nenhum. A minha África é uma história que cada um de nós carrega uma memória nostálgica, longínqua, perfeita, cada vez mais perfeita, com o passar do tempo, sem nunca lhe mexer. É uma história com apenas três personagens: o homem a trabalhar; a mãe a trabalhar e a cuidar da casa e de mim, e eu, o menino sem memória.
Mas lembro-me de um vizinho, um mulatinho pouco mais novo do que eu, que brincava comigo na varanda da minha casa. Era um menino triste de órfão.
À míngua de mãe, eu emprestava-lhe a minha, e uma vez, lembro-me bem, ele aninha-se no colo dela e pede-lhe “mamã, faz-me cabelo de branco”.
2 comentários:
Um momento bem Inspirado!
Uma pequena bela história... com sabor a cacimbo. Obrigado... mas vou esperando por mais... essa tua memória é um livro de histórias... com sabor a cacimbo.
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